Por Galen Burkholder e Tefera Bekere
É possível construir e dirigir uma equipe dinâmica, saudável e culturalmente diversa para cumprir a Grande Comissão? Nós cremos que sim.
Nossa experiência no trabalho com equipes internacionais e interculturais surgiu naturalmente, a partir do que somos e fazemos. Como discípulos globais, capacitamos as pessoas para que cheguem aos menos alcançados pelo Evangelho em suas próprias nações. Trabalhamos com grupos de igrejas, em colaboração com uma denominação, uma associação ou uma rede de igrejas existente, que, na atualidade, conta com mais de 1.400 afiliações diferentes em 62 países. Em colaboração com essas igrejas locais, agora servimos a 2.064 programas de formação missionária, localmente sustentáveis, ao redor de todo o mundo.
Trabalhar como equipe intercultural e internacional tem estado em nossa identidade organizacional desde que iniciamos há 26 anos, com cinco programas de treinamento de discipulado-missão em três países. Hoje, apenas 19% de nossos 155 membros da equipe estão na América do Norte; os demais vivem e trabalham em seus países de origem.
Temos seis pessoas em nossa equipe executiva, com quatro nacionalidades distintas representadas. Nossa Aliança de Formação é dirigida por uma equipe de oito pessoas de seis países. Viajamos juntos, nos capacitamos juntos, oramos, planejamos e nos edificamos mutuamente; tudo em meio a um ambiente de ampla gama de culturas e perspectivas. Desfrutamos ao compartilhar com os demais o que estamos aprendendo e escutando, sobre o que suas experiências têm ensinado.
A partir disso, vemos quatro chaves para construir e liderar uma equipe forte que é culturalmente diversa.
Tratar abertamente as diferenças culturais.
Pode parecer óbvio, mas falar abertamente sobre as diferenças culturais e as expectativas desde o princípio (e ao longo do caminho) é essencial para criar e dirigir equipes interculturais saudáveis. Não basta pensar: “Bem, terei que me acostumar a isso…”, como temos o hábito de fazer.
Identificar as diferentes perspectivas, padrões ou expectativas é algo que honra a todos os envolvidos. Tomar nota dessas coisas, mentalmente ou por escrito, para não as repetir cada vez que surjam. Decidir juntos como se vai tratar a equipe, as diferenças, e combinar de voltar a tratá-las mais adiante, se for necessário. Isso poderia permitir avançar rapidamente de uma maneira que se tenha acordado mutuamente. Deve-se ter cuidado de não remeter automaticamente à cultura dominante ou à preferência do líder da equipe. Por exemplo, os norte-americanos tendem a ser os primeiros a falar ou fazer declarações com vigor, contudo, permitir que os demais falem primeiro é uma forma de empoderamento, ainda que se tenha que convidá-los pessoalmente a intervir. Em questões como a programação, é prudente seguir ou adaptar-se à cultura do ambiente, especialmente no caso de uma reunião ou capacitação.
Desenvolver amizade e criar confiança.
“Há uma coisa que é comum a cada indivíduo, relacionamento, equipe, família, organização, nação, economia e civilização em todo o mundo. Uma coisa que, se é eliminada, destruiria o governo mais poderoso, o negócio mais exitoso, a economia mais próspera, a liderança mais influente, a maior amizade, o caráter mais forte, o amor mais profundo.” Essa coisa, segundo Stephen M.R. Covey, é a confiança. Estamos de acordo.
Se somos autênticos, construímos amizades, desfrutamos da vida em comum e tratamos as diferenças ou preocupações com prontidão, geramos confiança. Na maioria das culturas, a confiança se baseia na credibilidade. E a credibilidade costuma estabelecer-se e manter-se mediante pelo menos quatro coisas:
- Integridade: honestidade, pregar com o exemplo, ser coerente por dentro e por fora
- Intenção positiva: nossos motivos, nossa agenda e nosso comportamento resultante
- Capacidades: nossas atitudes, habilidades apreciadas, conhecimento e estilo
- Resultados: nossa trajetória, fazer as coisas bem e de forma correta.
Em nossas equipes interculturais, com frequência falamos de liderar pelo exemplo ou “modelar o caminho”. Compartilhar esse desejo e disciplina comum proporciona um nível saudável de responsabilidade mútua. Oferece oportunidades para praticar a “verdade em amor” enquanto buscamos juntos andar “de modo digno da vocação a que fomos chamados” (Efésios 4:1-15), e sejamos humildes, amáveis, pacientes, suportando-nos uns aos outros em amor, e esforçando-nos por preservar a unidade no Espírito. Tudo isso alimenta os relacionamentos interpessoais e, claro, a confiança.
Algumas de nossas melhores interações se produzem na hora do chá e do almoço, compartilhando nossas vidas e sendo discípulos enquanto viajamos, compartilhando o quarto à noite ou tomando o café. À medida que entendemos de onde as pessoas veem, suas alegrias e desafios, nosso apreço cresce.
Determinar um foco e prioridades claras.
A conexão e a unidade nas equipes interculturais crescem à medida que adotamos um foco comum e chegamos a um acordo sobre o que é mais importante agora e no futuro. Em nossas equipes, tratamos de manter três coisas em primeiro plano: por que estamos juntos (nossa visão)? o que vamos fazer para perseguir essa visão ou alcançar nosso propósito (nossa missão e foco central)? e como vamos abordar essa tarefa ou responsabilidade (nossos valores centrais e princípios decisórios)?
Para responder a essas perguntas como Discípulos Globais, temos desenvolvido o que chamamos nosso campo de ação, utilizando a analogia de uma quadra de futebol para definir onde trabalhamos e interagimos enquanto perseguimos nossa missão e visão.
Nossa declaração de missão e nosso foco central (nosso “quê”) definem as linhas do marco oponente que devemos alcançar com nosso jogo. As faixas laterais são definidas por nossos valores centrais, que definem “como” nos comportamos e interagimos com os demais; e os princípios decisórios clarificam “o que” fazemos. Esse cenário dos Discípulos Globais tem sido de grande utilidade para definir o foco e as prioridades gerais de nossas equipes culturalmente diversas.
Na hora de delegar tarefas específicas no âmbito transcultural, ampliamos essa questão para seis perguntas: “quem” deve fazê-la? o “que” queremos que se faça? “quando” queremos que seja feito? “onde” se fará (se isso é relevante)? “como” se vai fazer, se temos alguma preferência? E “por que você pede à sua equipe ou membro da equipe que o faça?”
Delegar eficazmente em qualquer cultura é desafiador, mas se multiplica através das culturas e facilmente pode tornar-se prescritivo ou ter um sentido paternalista. A clareza e a atenção para garantir um entendimento comum nos permite evitar muitas armadilhas ao liderar transculturalmente, se desenvolvemos um nível de confiança e amizade que fomente uma conversa aberta sobre nossas diferenças.
Nossas diferentes noções sobre o tempo e os prazos têm dado lugar a muitos debates interessantes sobre as diferentes expectativas. Quando construímos uma reserva nos prazos para assegurar que as coisas serão enviadas a tempo para a impressão e a preparação, um líder começou a perguntar: “Está realmente morta a linha agora?”
Definir a responsabilidade e a seleção dos líderes.
Expectativas claras são importantes, especialmente entre culturas diferentes. Quem deve estabelecer essas expectativas nas equipes interculturais? A suposição comum é que pode ser o líder da equipe, mas não é tão simples nas equipes multiculturais que buscam ser saudáveis. O papel de um líder é o de guiar a equipe no discernimento das expectativas mutuamente aceitas, nos padrões de responsabilidade e na forma em que os futuros líderes ou membros da equipe serão selecionados. Isso não tem que ser trabalhoso, se são retomados os princípios para construir e dirigir equipes culturalmente diversas. Estabelecer a confiança e a amizade para que os pontos de vista distintos ou contrários possam ser expressos livremente é essencial, e quando são combinados com um compromisso mútuo de escuta ativa, de fazer pausas e de orar (escutando sobretudo o conselho do Espírito Santo quando as diferenças persistem) supõe uma grande diferença.
Também enfrentamos pressupostos culturais sobre como se elegem os líderes. Em Discípulos Globais dizemos: “selecione bem, sirva bem”. Quando elegemos ou promovemos nossos colaboradores, exploramos sua adesão à nossa visão, missão e valores fundamentais. Sem isso não há necessidade de ir mais além.
Então consideramos quatro características (em inglês os quatro c: character, chemistry, competency and calling): caráter, química, competências e chamado (unção para o trabalho). Nos últimos anos também temos utilizado as três virtudes de Patrick Lencioni de “O jogador de equipe ideal”: humilde, faminto e emocionalmente inteligente (ou seja, empático e respeitoso). A consideração conjunta desses fatores proporciona um marco equilibrado e saudável para o discernimento na escolha e promoção entre culturas.
No entanto, é preciso tempo de qualidade com o candidato para que o membro da equipe possa aplicar essas considerações. Também temos feito com que um colega próximo passe tempo com o candidato em sua casa, com seu cônjuge e família. Nesses ambientes, temos aprendido muito, de forma que se têm evitado decisões potencialmente más e nunca lamentamos o tempo que passamos juntos durante a entrevista.
Em muitas culturas, promover uma pessoa jovem para liderar outra de maior idade ou com maior trajetória pode significar um desafio. É preciso ter tempo, paciência, comunicação aberta e reafirmação autêntica quando se trabalha com a pessoa de mais idade e com mais experiência que não é promovida. Pela graça de Deus, temos feito essa transição em várias ocasiões sem perder o líder mais veterano nem evidenciar que tenha diminuído sua paixão por nossa missão comum.
Por último, uma comunicação frequente e clara; pautas de responsabilidade bem definidas são essenciais para criar e dirigir equipes multiculturais saudáveis.
A falta de clareza nas funções, especialmente entre culturas, pode dar lugar a que os líderes desacelerem e tenham um rendimento inferior por não querer cruzar a linha das responsabilidades autodefinidas (ou por seu temor a sobrepor-se em responsabilidade que não é conferida a eles e que isso crie confusão). A maioria de nossos líderes de nível médio fornecem relatos semanais em métricas chaves de seus trabalhos.
Em papéis de alto nível, nosso padrão é um relato mensal e uma ligação, com outras conversas, conforme seja necessário. A maioria dos membros de nossa equipe multicultural são empreendedores e apaixonados pelo que fazem, não necessitando, por isso, de uma comunicação constante para se manterem focados. Mas a todos nos parece importante saber claramente pelo que somos responsáveis e com que métricas se medirá nosso desempenho.
Há uma profunda alegria e uma sensação de satisfação ao trabalhar com equipes multiculturais, já que estamos alimentados pelo amor de Cristo, energizados por amizades autênticas e impulsionados pela causa comum: dar a conhecer a glória de Deus entre as nações!
Bibliografia
Galen Burkholder ([email protected]), presidente / CEO da Global Disciples (Discípulos Globais), está apaixonado por ver o Corpo de Cristo trabalhando junto para que cada pessoa tenha una oportunidade para escutar e responder às Boas Novas de Jesus. Galen fundou o Global Disciples en 1996 depois de doze anos dirigindo um próspero programa internacional de discipulado e capacitação missionária. Galen e sua esposa Marie vivem em Landisville, Pensilvânia.
Tefera Bekere ([email protected]), vice-presidente da Aliança, nasceu e foi criado em um ambiente ortodoxo copta na Etiópia. Aos 18 anos, comprometeu sua vida com Jesus e foi discipulado na University Christian Fellowship. Enquanto ensinava na escola, durante onze anos, plantou 10 igrejas locais e foi preso três vezes por sua fé. Tefera se uniu à Global Disciples em 2007. Ele e sua esposa, Wolela, vivem em Lancaster, Pensilvânia.
Notas
1. Stephen M. R. Covey, The Speed of Trust: The One Thing that Changes Everything (Nova Iorque: Free Press, 2006), 1.
2. Patrick M. Lencioni, O Jogador de Equipe Ideal: como reconhecer e cultivar as três virtudes essenciais (Hoboken, NJ: Jossey-Bass, Inc, 2016).